O tempo, o vento e a Terra

Porto Alegre alagada. Foto: reprodução.

Como não pensar em Porto Alegre neste momento? Esse país imenso, onde coisas tão díspares acontece, é lá para os pampas que o pensamento voa no tempo temendo ventos de tempestade. Seria melhor encontrar Bibiana, o Capitão Rodrigo. Na minha galeria de personagens apaixonantes coloco Ana Terra ao lado da Capitu, de Machado de Assis, e Rosalina, de Autran Dourado. Os tempos de agora são dos Terra, dos Cambará.

“O tempo e o vento” é um dos mais belos títulos da literatura brasileira. A trilogia de Érico Veríssimo me foi apresentada ainda no colégio e, curioso, fui atrás da obra. Uma senhora imersão no Rio Grande do Sul. Na mesma época apareceu um comercial da Varig, da série “Conheça o Brasil”, e um filme bem ruinzinho, baseado no livro: Um certo Capitão Rodrigo. Teve melhor sorte quem viu Tarcísio Meira, anos depois, na pele da personagem.

Nesta semana vi a longa entrevista que Hildegard Angel fez com Maria Tereza Goulart. Uma outra intensa história, essa de gente real, sobre um tempo em que Jango foi personagem central da vida brasileira. De quebra, o papo ainda trouxe Leonel Brizola e fatos dos grandes fazendeiros gaúchos. Um desses fazendeiros, na atualidade, elegeu um prefeito que relegou ao abandono o museu – Memorial Casa João Goulart, contou Maria Tereza.

Titubeante texto que, como o vento, me leva para um lado, para outro, com dificuldade em encarar a calamidade, a destruição. O que incomodou bastante nos jornais foi saber que os prefeitos pedem evacuação de áreas densamente povoadas. Como? A rodoviária alagada, o aeroporto fechado, as estradas submersas, as pontes destruídas. E volta outra literatura, a poesia de Castro Alves que me faz exclamar “Deus, ó Deus, onde estás que não respondes?”

Um pix mais outros, tomara que sejam milhares, deve resultar em paliativos, socorro nessa hora trágica. E que todas as atenções sejam prioritárias aos que sofrem neste momento. E a palavra trágica veio conscientemente da lembrança de hamartia, para ressaltar que chuvas não são problemas. Problemas são as ações humanas que resultam em consequências terríveis. A natureza não grita mais pelo que fizemos e estamos fazendo; ela está respondendo.

Estamos vendo derreter o A68, esse que por algum tempo foi o maior iceberg do planeta. Sofremos um calor insano e temos sentido as altas temperaturas que nos colocam em antessalas do inferno. E continuamos produzindo lixo, aumentando pastos e para isso desmatando florestas. Assistimos guerras e genocídios que só fazem enriquecer os que produzem armas. E por aí vai.  São as ações humanas alterando a vida no planeta terra.

Que o tempo e o vento, guerras e distrações pop não nos façam esquecer da urgência de salvar nossa casa, a Terra. Antes de todo o planeta, nesses dias a urgência tem nome: Rio Grande do Sul!

Até mais!

Para contribuir:

*Passarim, da trilha de O tempo e o vento composta por Tom Jobim.

Neide Marcondes, que uniu arte e ensino

Neide Marcondes de Faria

“Estudem. Dominem o conhecimento e não abaixem a cabeça para ninguém!” Essa frase está entre as que guardei como norteadores para minha vida. O saber é forma eficaz de enfrentar o mundo e a autora da frase foi minha professora de História da Arte, Neide Antônia Marcondes de Faria. Livre docente da Unesp, professora doutora, autora, artista, Neide exerceu inúmeras atividades em que o conhecimento esteve à frente, base sólida.

No Instituto de Artes da Unesp, onde a conheci, tinha uma presença notável. Com delicadeza, sem nunca perder a determinação, transitou pela graduação e pós-graduação onde trabalhou para que seus alunos seguissem em frente, programando atividades dentro e fora da escola, indicando exposições, novos livros e cursos. Estabeleceu, com suas atividades, uma forma de atuação que tempos depois, percebi, passei a utilizar como professor.

Primeiro dia de aula, Neide apresentava a bibliografia, os motivos de utilizar um ou outro autor, os capítulos pertinentes a cada aula programada para cobrir o conteúdo da disciplina. Depois, reservava sempre um tempo para discutir os textos indicados e, perspicaz, não se deixava levar pela malandragem de alguns. “Por que você está dizendo isso? Não, você não leu o texto! Por favor, leia e depois volte a se pronunciar”. Recordo o vexame da pessoa, servindo de alerta para todos os demais. Os textos estavam lá, era só ler; esse é o trabalho do aluno.

Em um dado momento foi marcado um dia de estudos fora do campus. Os carros de quem os tinha, mais um fusca da professora, foram cheios de gente para a chácara onde mantinha seu ateliê, em Itapecerica da Serra. Mostrou-nos suas experiências plásticas, parte de sua biblioteca, as lembranças de viagem pertinentes ao nosso conteúdo. Egito, Grécia, Florença, Paris… Os principais sítios arqueológicos, museus e obras mais importantes deveriam ser visitados. Anos depois, no mestrado, quando me foi concedido bolsa ela não hesitou: Se você quiser ser mestre, vá estudar fora. Obediente, fui.

Ao relatar fatos pessoais busco ressaltar a professora que tive. Volto às primeiras aulas de História da Arte, quando ela nos deu aulas sobre a Grécia. Ela sempre dialogava com todos os alunos, e aquela aula foi pertinente para aplicar o método maiêutico, aquele do Sócrates, perguntando, perguntando, indo sempre mais a fundo no diálogo com o interlocutor. Quando o assunto chegou nos trágicos, procurei responder ao que ela perguntava.

Eu estudava teatro à fundo, estava naquele momento trabalhando com o diretor Antunes Filho, o assunto rendeu. Em um determinado momento ela deixou a lousa e caminhou até se sentar a meu lado, último da fila. Ao final do nosso longo diálogo, ela se dirigiu aos meus colegas: “Quando a gente encontra quem sabe mais, deve ceder o lugar, ouvir a pessoa.” Em seguida me convidou para falar sobre o Teatro Grego para as outras turmas, seus alunos. Assim me tornei seu monitor, tendo-a como orientadora em atividades da graduação e pós-graduação.

Outro momento marcante do nosso encontro, haveria um concurso para a cadeira de teatro no interior de Minas Gerais. “Quero que você faça. Mesmo que não passe, é para experiência. Você precisa saber como é que funciona”.  Indo além, me encaminhou para aulas particulares com o Professor Alexandre Luiz Mate. O docente avaliou, percebeu lacunas no meu conhecimento e fui beneficiado com as melhores aulas de teatro que tive até então. Fiquei empolgado, a professora sabia onde estava. Me pediu, antes que eu partisse para as provas, que ao chegar anotasse os nomes dos meus concorrentes e ligasse, passando-os para ela. No dia seguinte ao telefonema com minhas informações, ela retornou: “Esse concurso é para efetivação de fulano de tal. Mas, faça o que falta com o mesmo empenho. O que conta aqui é essa experiência”.

Neide Marcondes na Faculdade de Belas Artes de Lisboa.: Entre a Arte e o Ensino.

Na medida em que revolvo lembranças, a Professora Doutora Neide Antônia Marcondes de Faria ganha vulto. Através dela conheci e me tornei amigo do musicólogo Régis Duprat. Por indicação dela à Professora Dirce Ceribelli montei, de João Cabral de Melo Neto, o Auto do Frade. Dela recebi, e guardo com orgulho, uma carta de apresentação que me abriu portas profissionais.

Caminhamos por mundos distintos. Atuando em universidade privada fui professor de História da Arte. Em cada aula, em cada disciplina correlata, foram os autores e as aulas da minha professora a base que me permitiu, sem modéstia, o respeito e a admiração dos meus pares. Com tristeza recebi a notícia do falecimento de Neide, no dia 5 passado. Seu legado permanecerá nos livros publicados, nos trabalhos e artigos acadêmicos, mas sobretudo e principalmente nas ações de seus alunos, discípulos que levaram a outros e outros o conhecimento e a postura da grande mestra.

Aos familiares e amigos, meus sentimentos.

Notas:

1 – Entre os trabalhos de Neide Marcondes estão: (Des)Velar a Arte; O Partido Arquitetônico Rural no Século XIX; À Procura do Castelo dos Faria; Uma Guerrilheira (o)culta. Também participou das publicações: Cidades Histórias Mutações Desafios e Labirintos e Nós – Imagem Ibérica em Terras da América.

2 – As fotos acima foram copiadas da página do Instagram da professora.

Foi, não foi, segue a vida.

Toda segunda-feira é a mesma coisa. O cidadão que viu o jogo no domingo, assistiu aos “disse-me-disse” dos comentaristas, viu a repetição dos gols na tv e na internet, segue a vida. Ou seja, pega logo cedo o jornal, vai para o caderno de esportes, e conforme o resultado do time do coração envia provocações aos amigos, responde a outras. A hora do almoço será animada: foi pênalti, não foi, roubou, não roubou e, aos perdedores para o Palmeiras, resta a única e duvidosa réplica do populacho: não tem mundial!

Nelson Rodrigues, que em A Falecida faz um personagem alterar o enterro da esposa por conta do amor ao time, alardeava a paixão pelo futebol. E entre os apaixonados, como o corno da citada peça, há indivíduos com peculiaridades interessantes. Como aqueles caras obesos que invadem sedes dos próprios times exigindo dos esguios jogadores de futebol o que não são capazes de fazer em campo. Há outros, que vendem a própria casa para viajar em finais de campeonato, o que levou o sistema público de habitação a colocar a casa financiada no nome das esposas.

Nos tempos de faculdade constatei inúmeras ausências de alunos nas quartas-feiras. Os que vinham às aulas ficavam ansiosos, escondiam fones de ouvidos e não era raro um grito de gol em meio à explanação do professor. Havia entre os jovens aqueles que participavam das tais torcidas organizadas. Desde aquele cuja família vivia do negócio – alugar ônibus e levar torcedores às partidas – ao jovem que acreditava firmemente que gritar e pular durante 90 minutos era sua fundamental contribuição para a vitória do time. E por isso se julgava no direito de exigir o gol, o campeonato inteiro. E faltar às aulas, mesmo sendo reprovado por isso.

A família Rodrigues, do Nelson citado acima, foi dona de jornais. Ao perceber o quanto o esporte mexia com as pessoas tratou de criar os campeonatos que viraram febre no país. Para vender jornais e dar dinheiro aos cartolas há a repetição do que ocorre nas segundas, também nas quintas-feiras. E o excesso de campeonatos, aqui e no exterior, leva ao incauto torcedor o envolvimento constante e diário com o futebol. E toda uma imensa gama de negócios é movimentada.

Torcedor que se preza paga dez vezes mais o valor de uma caneca, “oficial”, assim também com uniformes e diversos outros cacarecos. As camisetas personalizadas com nomes de atletas são um caso à parte. O torcedor paga os olhos da cara para ter a camisa “oficial do craque da hora” e quando este passa a jogar para time rival recebe ódios mesclados com paixões recolhidas. No fundo de gavetas, em companhia das ridículas cartas citadas por Fernando Pessoa, estão as camisas nominadas com o craque um dia amado, idolatrado, salve, salve!

Faz pouco tempo, aqui em Santos, uma movimentação entre os banhistas chamou a atenção. Um atleta, morador do pedaço, dera pinta na praia e com simpatia e educação cumprimentou aos alvoroçados torcedores que pouco se importavam que, naquele momento, o indivíduo era um condenado na Itália aguardando a decisão que o levou a jogar no xilindró – notícias recentes dão conta que presidiários emprestaram chuteiras para o moço. Uma mudança notável! A nova postura quanto ao comportamento dos “heróis” está levando alguns a pagarem pelos seus crimes. Ao que uma observação apurada indica, continuarão sendo adorados e respeitados por um grupo restrito de gente que confunde esporte com vida.

Sinto-me ET quando exponho esse tipo de ideias, às vezes utilizando termos bem mais densos que esses acima. Atribuo minha postura ao antigo professor e diretor do colégio, um sujeito enorme, de origem alemã. Rígido em seus princípios, obrigava os alunos a praticarem todos os esportes. Todos! Cada modalidade contribuía na condição física e na educação moral dos alunos: o importante é competir! Completava e exclamava com frequência. E lá estávamos jogando vôlei, basquete, pulando na cama elástica, praticando as modalidades olímpicas e, é claro, o futebol. Em alguns momentos enfrentávamos adversários melhores, perdendo feio. Lá estava o diretor, no final, orgulhoso da nossa participação: Vocês jogaram com dignidade. Lutaram! O importante é competir.

A farra durante uma partida esportiva é sempre bem-vinda. E a tensão vale, pois a representação do embate está ali, “viver é lutar!”. E a comemoração, o sarro nos amigos é parte do combo. Vivi muitos anos atendendo telefonemas do meu irmão após cada jogo do Corinthians. Ele não falava nada. Colocava o hino para eu ouvir. Sempre respondi com palavrões adequados ao momento. Vários! E a rusga com o irmão terminava ali, já que é sabido que em dois, três dias haveria outro jogo. Ficar discutindo a morte da bezerra é muito chato. Uma briga só vale a pena quando é possível alterar o rumo das coisas. Se foi, se não foi, se teve, se não teve… A bola vai continuar rolando (Ops! Há um bafafá aí sobre a bola rolando!). Segue a vida.

D. Dirce, Mário de Andrade e a vida queer

Foto by Flávio Monteiro

Essa mania de classificar os seres vivos… É certo que D. Dirce, prima distante de minha mãe, não tinha a menor ideia do que seja a taxonomia. E se chegou a conhecer algum Aristóteles, provavelmente deve ter sido um vizinho de nome que não veio de nenhum santo. No entanto, D. Dirce era bamba em reconhecer uma imensa gama de seres animais e vegetais. Coisas que lhe foram úteis nessa vida.

Nascida na região do Bacuri, hoje Pioneiros, nas imediações de São Joaquim da Barra – SP, certamente aprendeu com a mãe, D. Palmira, a reconhecer todo e qualquer animal que transitava pelos campos. Reconhecia insetos malévolos como o barbeiro e distinguia aranhas peçonhentas de outras, inofensivas, por exemplo. Dentre a imensa gama de aves tinha a receita certa para cada uma e sabia realçar o sabor com temperos de próprio cultivo.

O conhecimento dos vegetais pode ter começado com as ervas aromáticas, ou com legumes e verduras cultivados na horta, onde se guardava espaço para plantas de uso medicinal. Boldo, erva cidreira, alecrim, carqueja, arruda… Havia em algumas dessas poderes místicos, que D. Palmira sempre usava em suas benzeções. Outras ervas, não cultiváveis facilmente, precisavam ser colhidas no mato.

Um dia cheguei arfando em Uberaba. O pulmão todo tomado por uma pneumonia. Sabendo da minha chegada, D. Dirce entrou em cena. “Vou no mato caçar assa-peixe. Ele vai ficar bom logo”. Contaminado pelo conhecimento escolar, não tinha ideia da planta anti-inflamatória e expectorante. Dia seguinte ela voltou com um imenso galho da planta, um tanto seca e judiada. “Tão acabando com tudo. Só tem lavoura, sem deixar que o mato cresça. Como vamos fazer pra ter remédio?” sentenciou a mulher.

Extrair o sumo de assa-peixe foi trabalho árduo e paciente da minha irmã, Walcenis. O gosto é insuportável e para disfarçar e fazer o doente engolir sem reclamar demais, misturou-se ao sumo o suco de beterraba e laranja. A beberagem pareceu magia: beber e voltar a respirar. Uma das amigas mais próximas de minha mãe – mantiveram amizade por décadas! –, D. Dirce faleceu alguns meses antes. E com ela, que não deixou livro escrito, foram-se os critérios para cultivar e reconhecer plantas, as melhores maneiras de tratar animais tornando esses o alimento necessário para a família.

Conhecer, distinguir, classificar… Muito, mas muito tempo depois de Aristóteles ter dividido os animais em “com sangue” e “sem sangue”, Lineu (Karl von Linné) elaborou um sistema baseado na estrutura. Nós, seres humanos, fomos classificados como Mammalia, do latim, significa que somos mamíferos: temos mamas! D. Dirce amamentou nove filhos. Hoje em dia mamas são aumentadas em academia ou com silicone, visando autoestima e sedução, atitude de classificação temporária, já que o tempo se encarregará de impor a força da gravidade para todos nós, com ou sem peitões.

Ocupada em cuidar da imensa família, D. Dirce não teve muito tempo para especular os porquês de certas coisas. Diante de situações de pessoas, por exemplo, com “sensibilidade queer”, ela fecharia o assunto com uma frase curta e certeira; “é da natureza delas!”. Acontece que o mundo não é simples assim, e tem mais tempo para se ocupar de certas coisas do que D. Dirce. Daí a gente contar com a exposição “Duas Vidas”, no MASP – SP, onde Mário de Andrade tem exposta essa questão.

Mário de Andrade, muita gente sabe, não classificou animais nem plantas. Mas o que ele distinguiu e classificou na cultura! O cara devia se alimentar de poesia, de romances, e para isso sacou que deveria entender de música, folclore, pintura, arquitetura. Num mundo interessado em lucro, ter um sujeito preocupado em preservar conhecimento e em criar e manter uma biblioteca que chegou aos 17 mil volumes é muito estranho! O cara não se casou, nem teve filhos. Estranhíssimo! Queer! Que vida é essa, particular? A pública era notória. “Duas vidas!”

O material de divulgação do evento justifica o nome da exposição, a partir de carta de Mário de Andrade escrita ao poeta Manoel Bandeira. Na carta, Mário escreve: “toda vida tem duas vidas, a social e a particular”. Os aspectos particulares da vida do poeta e escritor passaram para domínio público após 70 anos de sua morte. Creio que ele gostaria de ter sua correspondência analisada, estudada, do contrário teria queimado tudo. Pelas cartas sabemos o que pensou via diálogo com seus pares, com amigos, com autoridades. E deve ter sofrido por ser indivíduo de “outra natureza”, para manter neste texto a perspectiva de D. Dirce.

Por outro lado, especular e expor particularidades da pessoa Mario de Andrade é contribuir numa luta forte e constante, para que o ser humano seja o que sente que é. Que o homem “estranho” pode ser da envergadura, profundidade e importância irrefutável de um Mário de Andrade. Ninguém tem que ser e se identificar a partir da imposição de outro, da sociedade. Que venham mais exposições, e que tenhamos quantas classificações forem necessárias para nos aprofundarmos sobre o universo humano. O irônico é que quanto mais letras entrarem no sistema LGBTQIAPN+, mais claro ficara o quanto nos distinguimos dos outros animais: somos humanos!

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Flyer da exposição:

Os profissionais úteis

A manhã de segunda chama para as responsabilidades que temos para a semana. Além do trabalho cotidiano há que pagar contas, marcar médico e, necessário, dar uma paradinha para olhar o mundo. Pelo noticiário é o hábito costumeiro; há outras possibilidades simples como, por exemplo, abrir a janela e olhar a vida pulsando no céu, na rua, na vizinhança. O som familiar do caminhão vem junto com a voz dos coletores de resíduos e o ritual se repete.

Um rapaz vem à frente, facilitando o trabalho dos colegas que jogarão os sacos no interior da carroceria do caminhão. Acenam para moradores simpáticos, gritam entre si. O caminhão para em frente ao edifício vizinho. Entram rapidamente e tomam água, já à espera deles. Fresca e visivelmente gelada. O mínimo do tanto que devemos fazer por esses coletores dos resíduos que produzimos. Eles seguem com seu costumeiro alarido, falando coisas que não entendo, mas que percebo carregadas de bom humor.

Um adolescente bem vestido sai do sobrado em frente portando um saco bem cheio de sabe-se lá o que e entrega em mãos do coletor. Cumprimentam-se e o rapaz volta, abrindo a porta de um carro e toma seu rumo. Penso que nem tudo está perdido, já que há jovens percebendo nossa parceria fundamental com esses profissionais úteis, verdadeiramente necessários.

Certamente aguentaríamos algumas semanas sem o trabalho deles se produzíssemos apenas resíduos recicláveis. Mas, há os orgânicos, que em pouco tempo apodrecem e se indevidamente tratados resultam em doenças, pestes. E em seu árduo trabalho esses profissionais nos livram da proliferação de ratos, de baratas. O cheiro é péssimo. No entanto os rapazes coletores passam alegres, sem máscaras, expostos a coisas estragadas e podres que saem de nossas casas. Deveriam usar máscaras! Na real, deveríamos pensar e produzir algo que não os sufocasse e garantisse saúde enquanto correm pelas ruas limpando a cidade.

Coletores, varredores, hortelãos, lavradores, faxineiros, jardineiros, os seres úteis. Claro que médicos também são imprescindíveis, assim como engenheiros, dentistas, professores e outros profissionais. A questão é que há médicos, por exemplo, que só nos salvam se tivermos dinheiro para pagar a conta. E há os médicos dos postos públicos, essa maravilha brasileira que torna um médico o ser absolutamente útil. Assim como nossos coletores sofrem sem máscaras, o médico do “postinho” também sofre por não ter equipamentos necessários. Esse é o nosso mundo.

Sou interrompido pelo latido de dois cães que, devidamente amarrados pelos donos, se estranham no passeio público. Noto que os donos são obesos e lerdos, contrastando em muito com o corpo esguio e ágil dos coletores já próximos da esquina quando virarão e os perderei de vista. E penso em alguns desses profissionais que no exercício diário, correndo contra o tempo, e forçados pelo volume de trabalho acabam tornando-se campeões de corridas, fazendo valer o ditado que nos orienta a transformar limão em limonada.

Penso no sonho de cada coletor. Certamente, não foram crianças sonhadoras desejando correr pela cidade atrás de um caminhão fétido e sujo. São humanos, acreditam em um Deus, têm família, cuidam dos pais, dos filhos. Cuidam de nós, saneando nossas ruas, levando embora o que não queremos dentro de nossas casas. Não são estranhos, nem podem ser. São úteis. Merecem salário justo, digno. E sobretudo devemos à eles o respeito. Esse respeito que temos pela vida, pela nossa saúde, que depende do trabalho deles para que tudo caminhe da melhor maneira possível.

A mudança de Laura

Olhando para o computador travado ela se sentiu mais uma vez refém de algo não solicitado, não desejado. Não era a primeira vez que Laura se sentia assim, impotente diante de forças que estão muito além do que minimamente ela poderia enfrentar. Menina, bem menina, saiu da roça onde os pais amealhavam um pedaço de terra e, chegando na casa da madrinha que oferecera cama e comida durante o período da escola, ela descobriu o rádio.

A Madrinha Elvira gostava de jornais e revistas, mas a menina ainda não sabia ler. Gostava das fotografias impressas, das capas ilustradas com desenhos coloridos de casais apaixonados. Nada se comparava ao rádio com programas musicais, noticiários, novelas. Foi uma mudança e tanto! Do som de pássaros, dos ventos balançando árvores, dos animais no curral e no chiqueiro, ela passou a ser acordada por vozes graves dizendo “bom dia!” seguidos da alegre resposta de Elvira: Bom dia!

Apesar do medo diante de tantas novidades ela se manteve forte. Era desejo dos pais que conseguiram fazê-la entender ser necessário aprender a ler, a fazer contas, a conhecer as ciências. Tudo isso poderia e deveria ser utilizado no próprio campo onde eles prometeram, e ela sonhava, um dia voltaria em definitivo. Laura só não conseguia perceber quando ocorreria tal retorno.

Viver com a madrinha era mudança “para mais de metro”, ditado que aprendeu na cidade. O leite era entregue na porta, bem cedinho e em seguida vinha o pão, quentinho. Em dias alternados passavam o verdureiro, um vendedor de doces e, vez em quando, o carteiro batia palmas no portão. Iam à igreja com frequência, à praça com coreto no final das tardes de domingo, alegradas por uma banda com muitas marchas e modinhas. Pelo menos uma vez por mês iam ao cinema e Laura jamais esqueceu a luz apagada, a tela imensa e o primeiro filme, um romance açucarado. A madrinha chorava com a história. Ela se encantava com as imagens.

Muitos anos depois, já adulta e casada, deu-se conta de que a televisão tinha provocado outros hábitos e também o telefone tivera, aos poucos, colocado o carteiro em segundo plano.  Laura alimentou dúvidas sobre o bem que a tv poderia proporcionar, pois percebera que a câmera mostrava o que os donos da emissora queriam, o ângulo que eles desejavam. Já o telefone facilitara a vida de quem tinha leitura fraca, de quem não gostava de escrever.

Por muito tempo ela permaneceu fiel ao costume de enviar cartões de aniversário, por ocasião da Páscoa e pelas festas de final de ano. Em menos de uma década novas atitudes, novos protocolos, as respostas foram escasseando e definitivamente cessando substituídas por cartões virtuais. Nem se achava cartões para comprar. Tudo estava sendo rápido demais. Tão rápido que se fazia difícil perceber o que estava sendo imposto, as necessidades que estavam sendo criadas por conta de novidades, algumas não solicitadas, como as atualizações do computador. Laura estava cansada de correr atrás das mudanças que vinham de fora.

Tudo acelerado, vertiginoso. Todo consumo vira lixo. Os diferentes discos, compactos, k-7 e cds. As fitas VHS e os dvs, tudo rapidamente transformado em material obsoleto, ocupando espaços dentro de imóveis cada vez menores e mais caros, por isso mesmo exigindo que discos, fitas, livros se tornassem arquivos invisíveis, virtuais, inúteis com o computador travado, com a ausência de energia elétrica e as baterias descarregadas.

Já quase aposentada ela resistiu bravamente às redes sociais. Assumiu a imagem de mulher fora do tempo, só usando o computador para ler, pesquisar, utilizar serviços bancários e, ao telefone, só atendendo parentes e amigos próximos. Essa postura não veio por acaso, mas em consequência de perda de documentos por ataque de vírus e outras ameaças de golpes por telefone e e-mail. E de uma ojeriza que impunha mais do que o necessário, ser preciso ter o objeto do ano. O carro novo, o último modelo de telefone. Ela via crescer uma indisposição, uma resistência ao não desejado.

Nos últimos tempos, longe do trabalho, limitou-se a um aparelho básico para o caso de receber ou fazer chamadas urgentes. Contatos restritos a parentes, amigos, um pronto-socorro e um médico de confiança. Recebendo notícias via computador, gostava de pesquisar o mesmo fato, tentando saber o que realmente acontecia e o que cada empresa de comunicação estava defendendo. A tv fechada utilizada apenas para filmes e documentários, abandonando definitivamente as novelas que a encantaram na infância.

Então já enfrentara as piores mudanças advindas da morte do marido e da única filha, vítima de uma “bala perdida”, esse eufemismo para a incapacidade humana de controle da criminalidade. Ficara sozinha, morando fora do país o único neto com quem só conversava raramente, o que ela preferia acreditar ser fruto da diferença de fusos horários. Foi quando irritada diante do computador travado que pensou no futuro, em outras possíveis e previsíveis mudanças. Decidiu ser ela a autora e protagonista da vida que sonhara; algo que poderia ser vivido no tempo que lhe restava.

Dias depois riu quando um técnico sugeriu mais memória, outro eufemismo absurdo. Resistiu à ideia de um novo computador. Utilizou a pequena capacidade que ainda restava do aparelho para pesquisar, durante algumas semanas, até encontrar algo que atendesse aos objetivos pensados e decididos. E Laura encontrou. Uma casa de repouso no campo para pessoas em idade avançada, mas ainda com capacidade e disposição para mexer com horta, jardim e, se com vontade, a possibilidade de cuidar de galinhas, patos, porcos e outros animais domésticos.

Foi em uma segunda-feira que carregadores encontraram Laura, de pé e decidida, ao lado de duas malas modestas, apenas com roupas, uma maleta com álbuns de retrato e um caderno de lembranças. Segurava uma pequena bolsa com documentos, e o fatídico, mas necessário telefone celular. Os homens vieram para levar tudo, móveis e utensílios para uma instituição que ela escolhera. Viu saírem das janelas as cortinas, das paredes os quadros com paisagens e retratos familiares. Despediu-se de pequenos bibelôs, vasos com flores, o pequeno santuário e cada uma das imagens que ele abrigara.

Antes que os carregadores terminassem todo o trabalho chegou um conhecido corretor, com quem ela deixou a chave para que o imóvel pudesse ser vendido. Saiu sem olhar para trás, um leve sorriso nos lábios. Essa mudança, a penúltima, desejada e sonhada desde menina, de volta ao campo,  só seria interrompida pela mudança definitiva, fim de caminho nesse mundo, o que, certamente, não dependeria dela o dia, a hora e a forma de acontecer.

Papai faz cem anos!

Mineiro daqueles que falam muito pouco, em seus últimos anos entre nós, em todo 20 de fevereiro papai permanecia ao lado do telefone. Valdonei ligava, eu também. Ele nos ouvia e passava o telefone adiante: Sua mãe quer falar com você. Ficava na dele, aguardando as filhas e os netos que no final da tarde estariam por lá, comemorando no “cantinho do fuxico”, conversando sem parar enquanto ele, já com o radinho de pilha em mãos, punha-se a ouvir modas caipiras.

Não fosse minha irmã Walcenis, eu não me daria conta dos cem anos que meu pai faria nesse recente 20 de fevereiro. Cem anos! Desses, papai viveu mais de oito décadas entre nós e certamente, se tivesse que destacar fatos marcantes ocorridos desde 1924, ele não se esqueceria do rádio. Papai cresceu junto com o rádio. Viu o apogeu da Rádio Nacional e acompanhou os fatos mais importantes durante sua juventude ouvindo as caixas enormes, depois, já adulto, os pequeninos radinhos a pilha.

Certamente vieram pelo rádio as notícias da Segunda Grande Guerra, iniciada quando meu pai estava com 15 anos. O que teria pensado o jovem sertanejo vivendo no pedaço de terra dos pais, lá em Araguari, nas Minas Gerais? Mais, ainda, por que deveria ele pegar em armas e ir para a Europa participar de uma contenda que, provavelmente, não tinha certeza nem mesmo de como começou?

Também foi pelo rádio que papai ouviu as vitórias da Seleção Brasileira. O Brasil campeão mundial de futebol em 1958, Bi em 1962. A televisão era uma geringonça cheia de chuviscos, muito distante do cinema. Então, o negócio era ouvir os jogos pelo rádio e, eventualmente, ver as imagens pelo cinema. Não que papai tivesse hábito de ir ao cinema; a única história que me ocorre era que, em tempos de quaresma, no parque de diversões onde trabalhava projetavam cotidianamente uma “fita”: A Paixão de Cristo. Minha irmã Waldênia, já em idade de ficar sentadinha vendo o filme, ficava indignada com aquele sujeito que vinha todo o dia para a cidade onde acabava apanhando muito.

Um Parque de Diversões entrou na nossa família em fatos que os detalhes se foram com os personagens, todos já falecidos. O certo é que um irmão mais velho de Papai, Tio João, se encantou com uma bela senhora e caiu no mundo com o Parque de Diversões onde a dita cuja trabalhava, deixando a tranquilidade da fazenda em Araguari para conhecer as praças do país. Lá pelas tantas, meu pai decidiu acompanhar o irmão.

Espírito livre, papai não devia curtir os limites da fazenda e da vida no campo. Não gostou também das imposições dos padres, tendo estudado em um seminário, coisa comum aos meninos de então. Em 1945 foi convocado para a II Grande Guerra. Estava com 21 anos e com boa sorte, já que aquele ano também foi o fim do conflito armado. Em seguida papai trabalhou por um tempo na Companhia Goiás de Estradas de Ferro e, até onde guardo as histórias todas, de lá saiu indo trabalhar com o irmão no parque de diversões.

Há notícias de Lorena, no Vale do Paraíba, onde minha mãe, Laura, foi aprender com o marido coisas que o pai não permitia. Subir em árvores, andar de bicicleta, atirar com arma de fogo. No tal parque papai cuidada de um stand de tiro ao alvo. Tiros de chumbo e de rolha, em busca do praticante contar vantagens e ganhar pequenos brindes. Houve uma passagem por Ribeirão Preto, já fora do parque e veio a decisão de morar em Uberaba.

Fiz as contas (nunca fui bom em matemática!): Papai chegou em Uberaba com 31 anos e cinco filhos. O quinto, euzinho, na barriga de minha mãe, nascendo em junho de 1955. O sexto, Wander, veio anos depois. Além da filharada, trouxe na bagagem uma barraca e as espingardas, desde então participando de festas e quermesses da cidade com a barraca de tiro ao alvo do Bino. Atividade insuficiente pra manter todo mundo, Papai montou uma oficina no quintal. Conhecimento adquirido na infância e nas oficinas da estrada de ferro, passou a fabricar ferraduras – colocando-as nos animais – portões, dobradiças e outras peças sob demanda.

Papai não gostava de patrões. Deu um duro danado para não se submeter a terceiros. Criativo, aproveitou o espaço do quintal e a oficina para criar seu próprio parque. Uma por uma foram criadas as barracas, a maioria delas pintadas pacientemente pela minha irmã caçula, Walderez. Na medida em que o quintal ficou pequeno com os brinquedos todos, papai utilizou o pátio da Paróquia de Nossa Senhora das Graças para a montagem final, em acordo com o vigário de então, Padre Nicola Ruggi. O homem já tinha pisado na lua quando o parque foi inaugurado em uma quermesse paroquial. De lá meu pai saiu para percorrer todos os bairros da cidade, todas as cidades da região.

O parquinho fez meu pai conhecido em Uberaba. Pessoalmente, já morando fora, eu adorava descer de um ônibus na rodoviária, entrar em um taxi e pedir: me leva pra casa do Bino! Todos conheciam meu pai e a maioria foi gente amiga. Isto não implica ter sido ele obrigado a defender seu negócio, muitas vezes com os próprios braços, de arruaceiros e ladrões. Invariavelmente, quando ocorria algo do gênero, ele chegava em casa e, mesmo sendo altas horas, chamava todos os filhos e contava detalhadamente o ocorrido. Se o caso fosse engraçado, via-se lágrimas, pois meu pai era daqueles que chorava de tanto rir.

A parte do século vivida por meu pai nesse plano terreno ocorreu muita coisa. E o menino que nasceu na pequena Estrela do Sul, no Triangulo Mineiro, certamente não pensava em coisas como televisão ou mudança de capital. Papai gostava de Juscelino Kubitschek. Quando estava bem vestido se comparava ao líder político. Quanto aos demais políticos, tratava-os como mineiro, raposa que sorria para todos e raramente revelava o próprio voto.

Aos poucos papai foi mudando. Os filhos crescendo, os primeiros netos aparecendo, ele deixou a oficina pelo parque. Do fundo do quintal só surgia, sem que jamais soubéssemos de onde, forquilhas, borrachas e elásticos para papai fazer e premiar crianças visitantes com estilingues. Quieto, silencioso, a certeza de que ele gostara da criança estava naquele ato: fazer e presentear o brinquedo. Aos mais velhos, amigos meus e de meus irmãos, aparentemente sisudo, em pouco atribuía um apelido. Em dado momento, quando minha irmã apresentou o namorado, papai indagou sério: outro? E saia rindo, deixando que explicassem o jeito de ele ser.

Outras mudanças no século, a televisão acabando com os pequenos circos e parques, e papai vendeu o Parque Boa Vista, ficando apenas a barraca em ponto fixo, no Bairro da Abadia, da santa predileta do meu pai. Quando a procissão da Abadia, vindo do município de Água Suja passava por nossa rua papai era um dos que enfeitavam com arcos de bambu e bandeirolas, além de soltar fogos durante a passagem da santa, protetora do seu trabalho. E foi perto dela que trabalhou, até se aposentar.

Uma cachaça com os amigos, muita música no radinho de pilha e silêncio. Papai observava o mundo aos setenta, oitenta anos. Via noticiários, assistia ao futebol, mas creio que era difícil para ele acompanhar todas as mudanças que a virada do século estava impondo aos mais velhos. Os filhos formados, indo mais longe do que ele fora, as mulheres mais livres, assumindo o mercado de trabalho, a internet chegando e tornando tudo mais rápido, mais urgente. Às vezes rugia, lembrando o homem que usava os próprios braços, sempre armados para defender a família. Na maioria do tempo ficava quieto, sem nunca deixar de fazer peraltices, como prender um chapéu de palha na ponta de um bambu para colher frutas do quintal do vizinho ou, quando a cozinha vazia, invadir a geladeira para obter generosas porções de doce de leite. Após ser pego, ria. E no dia seguinte, mesmo tendo tomado a sobremesa, dizia para a Walcenis com a maior cara de pau:  Sua mãe não me deu doce!

Papai lutou pela vida à maneira dele. Nos aniversários dizia sempre, consegui mais um ano! Quando a doença chegou, lutou bravamente, incluindo nessa uma fuga do hospital, pois queria ir para casa. Viu a morte de Chico Xavier, em 2002, junto com a festa brasileira por mais uma Copa do Mundo. Um médico amigo conversava regularmente com ele sobre a doutrina espírita, que ele vira crescer em Uberaba, desde os tempos de trabalho conjunto de Waldo Vieira e Chico Xavier. Provavelmente essas conversas ajudaram-no em sua passagem, deixando com minha mãe o desejo de ter o velório feito na varanda, onde a família gostava de se reunir, com os portões abertos, para um adeus aos amigos.

Papai faleceu em 2005. Faria 100 anos em 2024. Tanta coisa tem acontecido nesse mundo. Desses 19 anos passados de sua morte, papai esteve e se mantém presente em nossas vidas, em nossos corações. E na vida de outros, amigos, conhecidos e, provável, seu nome anda até na boca de quem não sabe quem ele foi. Papai é nome de rua! Saber haver uma Rua Felisbino Francisco de Resende, o Bino, deve tê-lo feito feliz, honrado com as homenagens. Um momento em que, com certeza, ele deve ter sorrido e estufado o peito para dizer com a maior tranquilidade: Que nem o Juscelino Kubitschek!

Feliz centenário, Papai!